MINISTRO SUSPENDE PROCESSO DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL DA GRADIENTE

Uma liminar do ministro Raul Araújo, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), suspendeu o processo de recuperação judicial da Gradiente. Concedida anteontem a pedido do China Construction Bank, a decisão (tutela de urgência) acabou por provocar a suspensão da assembleia de credores, que aconteceria ontem.

A liminar é consequência de uma antiga discussão processual que definirá qual Justiça é competente para julgar o processo de recuperação judicial da fabricante de eletrônicos. O imbróglio se arrasta há anos. Iniciado em Manaus, o processo foi transferido para São Paulo. Mas poucos dias depois voltou para a capital amazonense.

Os desembargadores da 3ª Câmara do Tribunal de Justiça do Amazonas (TJ-AM) analisaram o mérito do conflito e mantiveram o processo no Estado. O China Construction Bank propôs, então, um recurso especial.

No STJ, após a concessão da liminar pelo ministro Araújo favorável ao China Construction Bank – Bradesco e Safra também pedem a suspensão do processo -, a 4ª Turma definirá o mérito, ou seja, quem é competente para julgar a recuperação judicial da Gradiente.

Ontem, porém, a Gradiente já apresentou pedido de reconsideração ao ministro para tentar reverter a liminar. Atualmente, o valor total de créditos devidos pela companhia a cerca de 300 credores é de R$ 1 bilhão.

A liminar obtida pelo banco chinês, contudo, foi parcial. Isso porque o ministro Araújo determinou que a 11ª Vara Cível e de Acidentes do Trabalho em Manaus permanece competente para deliberar sobre medidas de urgência do processo, até o julgamento do mérito pelo STJ.

Por isso, ontem mesmo, o banco chinês entrou com ação em Manaus para garantir a suspensão da assembleia. Ao analisar o pedido, o juiz Márcio Rothier Pinheiro Torres, da 12ª Vara Cível de Manaus, considerou a liminar do STJ e mandou suspender a sessão. Apontadas ambas as decisões judiciais e com a falta de quórum, a assembleia foi encerrada.

Profissionais que advogam para os bancos acreditam que a próxima assembleia de credores, agendada para 3 de julho, também não deve acontecer. Na sessão de ontem, uma representante do Banco Safra registrou publicamente que, se ocorrer, ela será nula. “A meu ver o ato é nulo se realizado com o processo suspenso”, diz fonte que prefere não se identificar.

Sobre a competência para julgar a recuperação judicial, o China Construction Bank alega que antes do pedido de recuperação ser feito em Manaus, em 2018, já havia um pedido de falência em São Paulo, de 2009. O parágrafo 8º do artigo 6º da Lei de Recuperação Judicial e Falência (nº 11.101/2005) determina que se um pedido de falência é distribuído em uma jurisdição, a mesma deve tratar de qualquer outro pedido de recuperação ou de falência, relativo ao mesmo devedor.

Já advogados que atuam para credores afirmam que a estratégia dos bancos é usada para tentar pressionar a empresa a fechar um acordo que seja mais favorável a eles.

O advogado Roberto Gomes Notari, do NDN Advogados, que representa a Gradiente (IGB Eletrônica S.A.) no processo, argumenta que assembleia de credores não é ato processual e o STJ já decidiu nesse sentido. Por isso, a decisão do ministro Araújo não impediria a sua realização.

Para defender a competência do juízo de Manaus, Notari afirma que os principais ativos da empresa estão no Estado. Além disso, diz que o primeiro pedido de falência na verdade foi feito em Manaus, dias antes do protocolado em São Paulo.

Ambos os pedidos de falência contra a Gradiente foram arquivados. Segundo o especialista em recuperação judicial Julio Mandel, esse cenário de incerteza é o pior para todo mundo: empresa,
credores e até os bancos. “O problema é que a Lei de Recuperação Judicial não define o que é principal estabelecimento, o que determinaria onde o processo deveria correr”, diz. Para ele, se o devedor optou por um lugar para pedir a recuperação judicial, o juiz deveria aceitar.

O advogado atuou no processo da empresa de transporte rodoviário Itapemirim, que ficou parado por dois anos por causa de conflito de competência entre Espírito Santo e São Paulo. “Prevaleceu São Paulo, onde está a diretoria e a recuperação está em andamento”, afirma.

Gilberto Giansante, ex-advogado da Gradiente, continua a entender que a competência é de Manaus porque 95% dos imóveis da companhia estão no Estado. De acordo com ele, no objeto social consta a atividade de exploração de imóveis.

“Agora, credores estão impedidos de dizer se aceitam o plano de recuperação, o que faz o processo ainda mais demorado”.

Fonte: Valor