Instituição acumula cerca de R$ 300 milhões em dívidas
O plano de recuperação da Universidade Candido Mendes (Ucam) foi aprovado pelos credores e homologado pela Justiça do Rio de Janeiro. A instituição acumula cerca de R$ 300 milhões em dívidas — a maior parte com trabalhadores. Os pagamentos serão feitos em até oito anos, com descontos que podem chegar a 50% do valor total dos créditos.
Esse processo é acompanhado de perto pelo mercado. A Candido Mendes foi a primeira entre as sociedades sem fins lucrativos a obter autorização da Justiça para utilizar o processo de recuperação judicial. Entrou com pedido em setembro do ano passado.
Existe discussão sobre as sociedades civis porque a Lei de Recuperações e Falências (Lei no 11.101, de 2005) se refere a “empresário” e “sociedades empresárias” para determinar quem pode entrar com o pedido de recuperação judicial.
A corrente que defende uma interpretação mais restritiva da norma afirma que as sociedades não podem ser enquadradas como empresas. Estas podem distribuir lucro, o que é vedado para as associações sem fins lucrativos, dizem os defensores dessa linha de entendimento.
Ganha cada vez mais força no meio jurídico, no entanto, uma outra corrente: a que defende que a associação pode ser considerada empresa se exercer uma atividade econômica de forma organizada, gerando receitas, empregos e impacto econômico-social.
“Estamos falando de um patrimônio da sociedade. A Candido Mendes tem 119 anos de serviços relevantes prestados para a educação do país. São 12 mil alunos e mais de mil funcionários”, destaca o pró-reitor jurídico da universidade, Celso Viana.
O plano de pagamento apresentado pela Candido Mendes foi aprovado com alto índice na assembleia-geral de credores — 94% concordaram com a proposta. O Banco do Brasil, no entanto, único na classe com garantia real, votou contra. Isso poderia ter sido um problema. Segundo consta na lei, tem de haver aprovação em todas as classes de credores.
A decisão ficou nas mãos do juiz Alexandre de Carvalho Mesquita, da 5a Vara Empresarial do Rio de Janeiro, onde tramita o processo de recuperação da universidade. Ele entendeu, ao analisar o caso, que houve “abuso de direito do voto”. Levou em conta que o banco sequer informou para a universidade, administrador judicial e demais credores os motivos pelos quais não concordava com o plano.
“Votando pela não aprovação, o Banco do Brasil está prejudicando toda uma universalidade de credores que esperam receber os seus créditos. Pode não ser o melhor cenário do mundo, mas em tempos não apenas de covid-19 como também de recessão econômica, é o que se tem para negociar”, frisou o juiz na decisão (processo no 0093754-90.2020.8.19.0001).
A dívida da universidade com o Banco do Brasil é de cerca de R$ 2,5 milhões. O plano prevê que o pagamento seja realizado em até oito anos.
A Candido Mendes tem até um ano para começar a cumprir o que está estabelecido no plano de recuperação. Os trabalhadores estão divididos em duas classes. Na primeira ficam aqueles que têm até 150 salários mínimos a receber. Ficou acordado que o deságio para quem tem direito a mais de R$ 30 mil será de 30%. A quitação ocorrerá em dois anos e meio.
Já os trabalhadores com valores mais altos a receber estão classificados na classe três, a dos quirografários. Para esses, o desconto pode chegar a 50% e o prazo de pagamento se estenderá por até oito anos. Há uma cláusula no plano, no entanto, prevendo que esse deságio poderá ser reduzido a depender do desempenho da universidade nos próximos anos.
Cristiano Tebaldi, pró-reitor de ensino da universidade, diz que o processo de recuperação está sendo essencial para a Candido Mendes. “Foi adotado para proteção, recuperação e prosseguimento. Sem a proteção, teríamos ficado sujeitos a ações de execução e penhoras e isso tem o poder de paralisar uma empresa”, afirma.
Sem os credores batendo à porta, a universidade ganhou fôlego para negociar as dívidas e, em paralelo, implementar um plano de reestruturação do negócio. Contratou uma empresa de consultoria e trabalhou, ao longo do ano, para centralizar as operações, o que reduziu os custos em R$ 27 milhões. Conseguiu ainda se reposicionar no mercado, aumentando a oferta de serviços.
Mesmo em um ano de crise, que afetou fortemente o setor de educação, diz Tebaldi, a Candido Mendes conseguiu manter os 8 mil alunos do ensino presencial e aumentar de 2 mil para 4,3 mil alunos na modalidade à distância.
Fonte: Valor Econômico