Mudanças no projeto tratam do prazo para empreender após falência e extensão da recuperação judicial a empresas do mesmo grupo
O projeto de reforma da Lei de Recuperação Judicial e Falência (PL no 10.220, de 2018) passou por novas modificações, que devem ser formalmente apresentadas na Câmara dos Deputados nos próximos dias pelo relator, o deputado Hugo Leal (PSD-RJ). As principais mudanças referem-se ao prazo para empreender depois da falência e a extensão da recuperação judicial a outras empresas do mesmo grupo.
O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), afirmou ontem que pretende aprovar o PL até o Carnaval. O texto, então, seguirá para debate no Senado.
As alterações são um meio termo entre o parecer apresentado em novembro pelo relator e a Lei de Recuperação Judicial que está em vigor hoje, segundo o advogado Pedro Teixeira, especialista em insolvência empresarial que auxilia o deputado Hugo Leal no desenvolvimento do texto. O complemento, ao qual o Valor teve acesso, ainda será lido na sessão.
Ao contrário do substitutivo anterior, que vedava a extensão da falência ou de seus efeitos, o novo texto passa a admitir que os efeitos da falência alcancem eventuais sociedades não sócias ou administradoras da empresa falida. A extensão deverá observar os requisitos do Código Civil para abuso de personalidade jurídica, como confusão patrimonial e desvio de finalidade.
Outra mudança, que desagradou advogados da área, afeta o chamado fresh start, o prazo para extinção de obrigações do falido, que, na prática, só poderá voltar a empreender depois disso. Hoje esse prazo é de cinco anos a partir do encerramento da falência.
O substitutivo previa três anos a partir da decretação da falência. Agora, considerando que alguns procedimentos podem demorar mais de três anos, contados da decretação da falência, o marco temporal do fresh start passou a ser a sentença de encerramento da falência.Isso é um problema, na opinião de advogados, pois muitas vezes não ocorre o trânsito em julgado da falência, o que faria com que o prazo nunca começasse a ser contado.
As mudanças atingem dois pontos essenciais do projeto, afirma Renato Scardoa, sócio do Franco Advogados. “O problema no Brasil é a falência. Porque em qualquer economia mais madura é natural um empreendimento dar errado”, afirma. Segundo o advogado, o trânsito em julgado pode demorar de dez anos “até o infinito”, o que impede o empreendedor de voltar ao mercado. “Há falências que não acabam”, diz. O segundo ponto também incomoda, defende Scardoa, pois deixa mais fácil estender a falência a outras empresas do grupo mesmo que não ocorra fraude.
O PL no 10.220, de 2018, entrou e saiu da pauta do plenário da Câmara algumas vezes no fim de 2019. A votação esbarrou em divergências políticas e na extensão da proposta, que tem duas centenas de páginas.
Na última sessão do ano, o texto quase foi votado por acordo, mas o líder do PDT na Câmara, deputado André Figueiredo (CE), disse que o PL contrariava interesses do setor produtivo e favorecia os bancos. Sem consenso, a votação foi adiada para fevereiro, mas ainda persistem divergências com a oposição. “Estão debatendo, mas não há acordo para votar”, disse o líder do PT, deputado Ênio Verri (PR).
A versão que será votada na Câmara começou a ser costurada em março do ano passado, quando Maia designou Hugo Leal – que é advogado – para a relatoria. Para facilitar o consenso e a tramitação, pontos polêmicos, como alienação fiduciária (garantia aos bancos em empréstimos e financiamentos) e a recuperação judicial do produtor rural, ficaram de fora do relatório.
Fonte: Valor